segunda-feira, 29 de junho de 2009

Eva Golinger: O primeiro golpe de Estado de Obama

[Nota: Nesse momentos são 11:15 da manhã, horário de Caracas. Manuel Zelaya, presidente de Honduras, está falando ao vivo na Telesur, desde San José (Costa Rica). Confirma que esta madrugada alguns soldados entraram abrindo fogo em sua residência e ameaçaram de morte a ele e sua família, si se opusera ao golpe de Estado. Se viu obrigado a acompanhar aos soldados, que o transportaram a uma base aérea, de onde voou a Costa Rica. Solicitou que o governo dos Estados Unidos emita um comunicado em que se condene o golpe, pois o contrário significaria sua relação com o mesmo.]

Caracas (Venezuela). – A mensagem de texto que chegou no meu celular esta manhã dizia assim: “Alerta, Zelaya foi seqüestrado, golpe de Estado em marcha em Honduras. Divulgue.” Foi um duro despertar em um domingo pela manhã, sobretudo para os milhões de hondurenhos que se estavam preparando para exercer, pela primeira vez, seu sagrado direito ao voto em um referendo consultivo sobre a convocatória de uma Assembléia Constituinte para reformar a Constituição. Supostamente, a disputa se contra no referendo convocado para hoje, que não é vinculante, senão apenas uma pesquisa de opinião para determinar si uma maioria de hondurenhos desejam, ou não, que se inicie um processo para modificar a Constituição.

Uma iniciativa deste tipo nunca teve lugar nessa nação centro-americana, cuja constituição é tão limitada que somente permite uma mínima participação do povo hondurenho em seus processos políticos. Tal constituição, redigida em 1982, no momento auge da guerra suja do governo de Reagan em centro - américa, foi desenhada para instituir aqueles que detinham o poder tanto econômico como político pudessem mantê-lo com mínimas interferências do povo. Zelaya, eleito em novembro de 2005 pela plataforma do Partido Liberal de Honduras, havia proposto a pesquisa de opinião para determinar si a maioria dos cidadãos estavam de acordo em que era necessária uma reforma constitucional. Sua proposta foi apoiada pela maioria dos sindicatos e movimentos sociais do país. Dependo desses resultados, seria organizado um referendo durante as próximas eleições de novembro para votar sobre a convocatória de uma Assembléia Constituinte, mas a pesquisa prevista para hoje não era vinculante, quer dizer, não tinha caráter aprobatório, de acordo com a lei.

De fato, vários dias antes do previsto para o referendo, a Corte Suprema de Honduras declarou ilegal a petição do Congresso. É preciso sinalar que ambos, Congresso e Corte Suprema, estão controlados por maiorias contraria a Zelaya e por membros do ultraconservador Partido Nacional de Honduras (PNH). A ilegalidade deu lugar a manifestações massivas favoráveis ao presidente Zelaya. No dia 24 de junho, o presidente destituiu ao chefe do alto mando militar, o general Romeo Vásquez, depois que este se negou a permitir que os militares distribuíssem o material eleitoral para a consulta de hoje. O general Vásquez, manteve o material sob estrito controle militar e se negou a distribuí-lo, inclusive aos seguidores do presidente, com a desculpa de que a Corte Suprema havia declarado ilegal a consulta prevista e, portanto, não podia obedecer a ordem presidencial. Igualmente ao que sucede nos Estados Unidos, o presidente de Honduras é que somente o comandante em chefe tem a última palavra em qualquer ação militar, pelo que se ordenou a destituição do general. Ángel Edmundo Orellana, ministro de Defesa, também foi demitido como resposta a esta situação que estava cada vez mais tensa.

No dia seguinte, a Corte Suprema de Honduras restituiu em suas funções ao general Vásquez, ao declarar “inconstitucional” sua destituição. Milhares de hondurenhos saíram às ruas de Tegucigalpa, capital do país, em apoio ao presidente Zelaya, como mostra de sua determinação de assegurar que a consulta não vinculante pudesse acontecer. Na sexta-feira passada, o presidente e um grupo de centenas de seguidores, marcharam até a base aérea para recuperar o material eleitoral previamente seqüestrado pelos militares. Aquela noite, Zelaya realizou uma conferencia de imprensa nacional junto a um grupo de políticos de diferentes partidos e movimentos sociais, na qual se fez um chamado à paz e à unidade no país.
Ontem, sábado, se informou que a situação em Honduras era tranqüila. No entanto, na madrugado de hoje, domingo, um grupo de aproximadamente sessenta militares armados assaltaram à residência presidencial e tomaram Zelaya como refém. Depois de várias horas de confusão, começaram a filtrar informações segundo as quais o presidente foi transportado para uma base aérea e levado para a vizinha Costa Rica. Até o momento não existem imagens do presidente e se desconhece si sua vida está em perigo.

Por volta das 10 da manhã , horário de Caracas, Xiomara Castro de Zelaya, esposa do presidente, denunciou ao vido em Telesur que na madrugada do domingo, os soldados invadiram sua residência disparando, bateram no presidente e o seqüestraram.
“Foi um ato covarde”, disse a primeira dama referindo-se ao seqüestro, que se deu em uma hora em que ninguém podia reagir. Castro de Zelaya fez também um chamado para que mantivessem com vida a seu marido e indicou que inclusive ela desconhecia seu paradeiro. Acrescentou que suas vidas seguem em “grave perigo” e pediu que a comunidade internacional denunciasse este golpe de Estado e atuasse com rapidez para reinstalar a ordem constitucional do país, o qual inclui o resgate e regresso do democraticamente eleito Zelaya.

Evo Morales e Hugo Chavez, presidentes de Bolívia e Venezuela, realizaram declarações públicas na manhã deste domingo, nas quais condenaram o golpe de Estado em Honduras e fizeram um chamado para que a comunidade internacional reaja, no sentido de restaurar a democracia e que regresse ao seu posto o presidente constitucional. Na quarta-feira passada, 24 de junho, aconteceu na Venezuela um encontro extraordinário dos países membros do ALBA (Alternativa Bolivariana para as Américas) , da qual forma parte Honduras, com o fim de dar boas vindas à organização a Equador, Antigua, Barbados, San Vicente e Granadinas. Durante o encontro, ao qual participou Patrícia Rodas, ministra de Relações Exteriores de Honduras, foi lida uma declaração de apoio ao presidente Zelaya na qual se condenava qualquer tentativa de impedir seu mandato e o processo democrático de Honduras.

Informes provenientes de Honduras estabelecem que o Canal 8 da televisão pública foi tomada pelas forças golpistas. Há poucos minutos Telesur anunciou que os militares hondurenhos estão cortando a eletricidade do país. Segundo informou a Ministra Rodas em Telesur: “ A comunicação telefônica e a eletricidade estão cortadas. As televisoras emitem desenhos animados e telenovelas e não informam ao povo de Honduras o que está sucedendo. “ A situação é muito parecida ao golpe de Estado de abril de 2002 contra o presidente Chavez na Venezuela, quando os meios desempenharam um papel chave, em primeiro lugar manipulando a informação como apoio ao golpe e, posteriormente, eliminando qualquer informação, uma vez que o povo começou manifestar-se e terminou por derrotar as forças golpistas regatando Chavez, que também foi seqüestrado pelos militares, e restaurando a ordem constitucional.
Honduras é uma nação que foi vítima no século passado de ditaduras e múltiples intervenções dos Estados Unidos, entre elas várias invasões militares. A última intervenção importante do governo estadunidense em Honduras aconteceu durante os anos oitenta, quando o governo de Reagan financiou esquadrões da morte e paramilitares com o fim de eliminar qualquer “ameaça comunista” em centro-américa. Naquele momento, John Negroponte era o embaixador estadunidense ante ao governo de Honduras e foi o responsável direto do financiamento e treinamento dos esquadrões da morte hondurenhos que assassinaram e desapareceram com milhares de cidadãos na região.

Na sexta-feira passada, a Organização de Estados Americanos (OEA) convocou uma reunião extraordinária com o fim de discutir a situação em Honduras. Posteriormente se emitiu um comunicado no qual condenou as ameaças à democracia e autorizou a viajem a Honduras de um grupo de representantes da OEA. Não obstante, na sexta-feira, Philip J Crowley, secretário de Estado adjunto estadunidense, se negou a definir posição do governo estadunidense com respeito ao possível golpe de Estado contra o presidente Zelaya e, em seu luar, emitiu uma ambígua declaração na qual declarava que Washington apoiava a posição do presidente Zelaya. Enquanto que a maioria dos governos latino-americanos declararam sem nenhum gênero de dúvida sua mais rotunda condenação dos planos golpistas de Honduras e seu contundente apoio ao presidente constitucionalmente eleito, o porta-voz estadunidense anunciou: “Nos preocupa a ruptura do diálogo político entre os políticos hondurenhos sobre a consulta constitucional de 28 de junho. Instamos às partes a que busquem uma solução democraticamente consensuada ao atual beco sem saída político, que seja conforme a constituição e as leis hondurenhas referentes aos princípios da Carta Democrática Inter-america.”

Hoje, domingo, às dez e meia da manhã, Washington ainda não emitiu nenhuma declaração relativa ao golpe de Estado em Honduras. A nação centro-americana é muito dependente da economia estadunidense, que lhe assegura uma das principais fontes de ingressos, as transferências de dinheiro que enviam os hondurenhos que trabalham nos Estados Unidos sob o programa de “estatuto temporal protegido”, instaurado durante a guerra suja de Washington na década de 80 por causa da enorme imigração a território estadunidense para escapara da zona de guerra. Outra fonte importante de ingressos de Honduras é USAID, que injeta mais de 50 milhões de dólares anuais para programas de “promoção à democracia”, os quais habitualmente dão apoio a ONG e os partidos políticos favoráveis ao interesses dos Estados Unidos, como foi o caso na Venezuela, Bolívia e outras nações da região. O Pentágono também mantém a base militar de Soto Cano em Honduras, com aproximadamente 500 soldados e numerosos aviões e helicópteros de combate.

Patrícia Rodas, ministra de Relações Exteriores, disse que tentou repetidamente entrar em contato com Hugo Llorens, embaixador dos Estados Unidos em Honduras, mas até o momento não havia respondido a nenhuma de suas chamadas. O modus operandi do golpe de Estado deixa bem claro que Washington está implicado. Nem o exército hondurenho, cuja maioria foi treinada pelas forças estadunidenses, em as elites políticas e econômicas do país derrocariam a um presidente democraticamente eleito sem o apoio e respaldo de Washington. As forças conservadoras de Honduras submetem ao presidente Zelaya a ataques cada vez mais freqüentes por sua crescente relação com os países do ALBA, em particular com Venezuela e o presidente Chavez. Muitos estão convencidos de que este golpe pretende assegurar que Honduras não seguirá aproximando-se dos países mais esquerdistas e socialistas da América Latina.

Texto traduzido por Leonardo Fernandes desde o site rebelion.org
Link para texto em espanhol: http://rebelion.org/noticia.php?id=87762

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